O QUE EXISTE DEBAIXO DO PÉ?
As plantas de um modo geral permanecem, tanto no imaginário popular, quanto para a ciência, vistas de forma superficial. Seja pelo desenvolvimento ou mesmo pela forma de locomoção, esses seres ainda não são vistos com o devido respeito que necessitam. Damos mais valor aos animais que as plantas. E essas por sua vez, por serem quase que inanimadas, são muitas vezes tratadas como objetos. Essa perspectiva acerca destes serem vem melhorando à medida em que a ciência avança. Mas as informações que possuímos ainda é uma parcela muito pequena do que realmente ainda se tem para aprender. Este conhecimento apurado acerca das plantas, se torna ainda mais distante quando se percebe que várias espécies de plantas desaparecem em um ritmo acelerado. São várias vidas ceifadas sem que ao menos as conhecêssemos.
Segundo o biólogo português José Feijó e seu grupo na Universidade de Maryland, Estados Unidos, as células das plantas se comunicam entre si trocando compostos químicos, como nos neurônios no sistema nervoso dos animais.¹ Ainda, segundo João Paulo Feijão Teixeira, do Instituto Agronômico de Campinas: “Embora pareça que o comportamento de plantas seja mais simples que o dos animais, recentes descobertas desafiam essa noção, revelando que as plantas antecipam condições futuras com precisão, ao perceberem e responderem a sinais confiáveis do ambiente, também exibem memória alterando comportamento dependendo de suas prévias experiências ou de seus ancestrais. Esse comportamento inteligente é exemplificado pela versatilidade excepcional de plantas para lidar com estresses abióticos, bem como o ataque microbiano e de insetos, equilibrando reações defensivas apropriadas. Uma das razões para tanto é que os vegetais estão em constante comunicação com uma multidão de diversos organismos.”² Só esses fatores já deveriam causar em nós uma reflexão acerca da forma como tratamos esses seres vivo e de como é a nossa relação com eles poderiam ser mais afetivas e respeitosas.
Em seu processo de criação a artista Rossana Mendes tenta chamar a atenção para esses seres através da via afetiva e estética. Trabalhando basicamente com a técnicas óleo sobre tela, a artista recria árvores em ângulos diversos. Suas árvores nascem de relações afetuosas da memória. Essas árvores surgem quase que abstratas, cheias de sinuosidades imbricadas e cores em sua maioria vibrantes. Nessas criações artísticas Mendes busca expressar o simulacro do que vemos, observamos e sentimos ao estarmos debaixo de uma árvore.
Cada quadro se apresenta como uma melodia dinâmica, composta com linhas, cores e formas que se revelam à medida em que os olhos do observador percorrem a superfície da tela. Suas obras são dinâmicas como a vida das árvores, que se transformam e se recriam a cada estação.
O papel da memória em sua obra não é apenas o de simples reconhecimento de conteúdos passados, mas um efetivo reviver, que leva em si todo ou parte deste passado. De fazer aparecer novamente coisas depois que desaparecem. O reviver do acolhimento e das boas sensações que esses entes nos proporcionaram e ainda proporcionarão ao longo das nossas vidas. Quem de nós não traz em suas lembranças de infância a imagem de uma árvore acolhedora, como as frondosas mangueiras com suas sombras refrescantes e seus frutos saborosos?
“Debaixo do Pé” é um tributo a esses seres do reino vegetal que nos dá abrigo, alimento, alegrias, frescor, encantamento, perfume e, acima de tudo, a vida.
Vone Petson - curador
Notas
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Teixeira, Joao Paulo. (2016). Comunicação entre plantas como estratégia de defesa. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/308102404_Comunicacao_entre_plantas_como_estrategia_de_defesa/link/57d9e0b808ae6399a39ae521/download